Estudo da Fundação Dom Cabral e da JValério apresenta que 26% dos 207 entrevistados em todo o Brasil se preocupam com plano sucessório; educação financeira dos herdeiros é mais um desafio do setor
A Fundação Dom Cabral (FDC) e a JValério Gestão e Desenvolvimento divulgaram nesta semana o resultado da pesquisa “Governança e gestão do patrimônio das famílias do agronegócio”. Foram ouvidos 207 gestores de todo o território nacional e realizadas análises quantitativas e qualitativas. Mais de 80% dos empreendimentos são comandados pelos fundadores (41%) ou pela segunda geração (41%). Apenas 16% dos gestores fazem parte da 3ª geração e só 1% são da quarta adiante.
A sucessão familiar foi apontada na pesquisa por 26% dos entrevistados como um dos principais desafios para as famílias empresárias do setor do agronegócio. Mais de 70% delas não têm um conselho de família formado. “Apenas 7% possuem um conselho constituído. É um índice baixo, bem menor que o de outras empresas familiares de outros setores da nossa economia. O estudo apontou ainda que 40% dos negócios possuem um plano de sucessão e que a transição no comando deve acontecer na esfera ‘pai para filho’. Apenas 5% dos participantes avaliam a contratação de um executivo fora do núcleo familiar para gerir o negócio”, conta Clodoaldo Oliveira, diretor executivo da JValério Gestão e Desenvolvimento.
Ainda de acordo com o estudo, a média entre as organizações dos segmentos do agronegócio é de 66% no que diz respeito à elaboração de um plano sucessório. As empresas que se dedicam à pecuária são as que têm menor aderência em relação ao planejamento do processo de sucessão: apenas 20%.
Clodoaldo Oliveira destaca ainda que a preparação dos herdeiros para assumir o negócio é crucial para a longevidade das empresas familiares do agronegócio. Na opinião dele, o primeiro passo é que haja a manifestação de interesse pelas novas gerações, muitas vezes atraídas para a migração para as cidades e para o trabalho em outras áreas.
Segundo o levantamento da FDC e da JValério, 17% afirmam que há herdeiros extremamente interessados em tomar dianteira dos negócios; 57% (a maioria) disse que há alguns interessados; e 6% se mostraram indiferentes.
Uma das questões que pode quebrar essa barreira é o diálogo aberto entre os familiares. “A boa comunicação entre eles e o entendimento das ideias das gerações mais jovens, além do investimento em recursos tecnológicos, pode incentivá-los a levar para frente o legado dos pais e manter a tutela da empresa entre os membros da família. Mas para isso, precisam ser treinados para evitar decisões equivocadas e prejuízos que podem afetar a sustentabilidade da organização. Nem sempre é fácil conciliar os interesses pessoais com o do negócio, mas esse é um princípio básico que deve ser trabalhado na sucessão familiar. O plano sucessório, acompanhado por especialistas no assunto, é necessário, sobretudo, para diminuir os conflitos na hora da passagem do bastão”, afirma o diretor executivo da JValério.
Ele acrescenta que a gestão familiar nas empresas do agronegócio tem mais uma peculiaridade: a carência de dados é maior e a tomada de decisões é realizada de acordo com o ‘feeling’ do dono. “O olhar para a governança nas propriedades é algo novo e está acontecendo em razão de um novo momento de vida dos fundadores. Eles prosperaram nesta atividade, migraram do Sul para o Cerrado e viram suas operações crescer de forma vertiginosa, acompanhando o crescimento do agronegócio brasileiro. Naturalmente, chegou a hora de olhar para os filhos e pensar na continuidade do negócio. O fato é que esse ramo é essencialmente familiar e para que a empresa prospere a família precisa seguir unida, no mesmo propósito. Essa é a base de um empreendimento agronegócio. Se a família se dividir, há riscos de perder a competitividade”, avalia Clodoaldo Oliveira.
A gestão do patrimônio também foi citada como um dos desafios pelos entrevistados: 26% apontaram a preocupação com educação financeira e a preparação de herdeiros; e 23% enxergam a profissionalização da gestão do patrimônio financeiro como uma necessidade. Outro dado da pesquisa informa que apenas 38% dos participantes acreditam que os familiares estão preparados para gerir o patrimônio; 4% reconhecem que não estão preparados, mas que há interesse e 34% entendem que nem todos os membros estão preparados, mas que buscam conhecimentos. Apenas 21% declararam não estar preparados e sem interesse em conhecer mais sobre o assunto.
Para se ter uma ideia da importância da gestão patrimonial, 70% disseram que esse é um dos temas mais discutidos nas reuniões de Conselhos de Administração.
Outro dado que chama atenção na pesquisa é que, atualmente, 75% do patrimônio destas famílias empresárias está voltado para investimentos no campo. No entanto, nos próximos cinco anos, pretendem diminuir o investimento no setor com vistas a aumentar o patrimônio por meio de investimentos financeiros no Brasil e no exterior.
Quando questionados sobre os objetivos considerados importantes ou extremamente importantes na gestão patrimonial, 95% responderam preservar o patrimônio atual da família; 95% desejam proteger a família em caso de alguma eventualidade; e 88% acreditam que é importante deixar um legado/patrimônio para as próximas gerações.
Além disso, a pesquisa demonstra que mais da metade das famílias (51%) já fazem planejamento financeiro e/ou de gestão patrimonial, com maior concentração para as famílias cujas empresas possuem faturamento acima de R$ 1 Bi (73%).
Clodoaldo Oliveira esclarece que, quando falamos em longevidade nas famílias empresárias no agronegócio é preciso levar em conta dois tipos de sucessão: a patrimonial, que envolve direito tributário, societário e sucessório família; e a sucessão empresarial, propriamente dita, como foco na gestão.
Ele ressalta que é importante organizar a propriedade rural como uma empresa familiar. “Já pensou em tornar seus filhos sócios da propriedade mesmo que eles exerçam outras profissões, fora das cercas da propriedade? Essa é uma realidade comum. Por isso, é preciso adotar medidas de economia e proteção jurídica das pessoas e da empresa rural. Quanto mais for profissionalizada a gestão da propriedade, menores serão os conflitos familiares a curto e longo prazo”, recomenda Oliveira.
Para 69% das respondentes femininas o gênero não é relevante na tomada de decisões sobre uso do dinheiro e de investimentos nas famílias empresárias do agronegócio e, para 81% delas, esse também não é um atributo relevante no processo de sucessão. Na visão das mulheres do campo, elas são reconhecidas nas fazendas por sua capacidade de liderança, independente do gênero, sendo que 83% daquelas que fazem parte das novas gerações encontram maior abertura para assumir posições de chefia. Esse é um sinal de que o progresso e as mudanças culturais estão na agenda do setor do agronegócio.