É possível as empresas serem competitivas e inclusivas ao mesmo tempo? O que favorece ou dificulta essa relação? Para buscar respostas a essas e outras perguntas, a Fundação Dom Cabral (FDC) desenvolveu a pesquisa inédita Inclusão Social e Competitividade de empresas com operações no Brasil: Uma análise da percepção de executivos C-Level em grandes e médias organizações. Participaram da pesquisa 159 executivos dos níveis estratégicos de empresas de médio e grande porte, com atuação predominante no setor de serviços (59,3%) e indústria (35,4%), que operam nacionalmente (65,5%) e internacionalmente (34,5%).
Gráfico 1 » Distribuição de respondentes por cargo
Gráfico 2 » Distribuição das empresas por mercado geográfico
Qual a relação entre inclusão social e a competitividade das empresas?
Os respondentes da pesquisa avaliaram o quanto concordam com a seguinte afirmação: “Inclusão social vai além da responsabilidade social praticada atualmente pelas empresas. Ações inclusivas implicam uma intenção de gerar maior competitividade para as empresas ao mesmo tempo em que contribuem para melhorar a qualidade de vida das pessoas e reduzir a desigualdade social”. O nível médio de concordância foi 58%, o que indica uma percepção dos executivos que o impacto social das empresas não está dissociado de seus negócios e pode, inclusive, ser fonte de vantagem competitiva.
Grande parte dos respondentes acredita que a inclusão social tem uma influência positiva ou muito positiva na competitividade. A pesquisa investigou três formas por meio das quais as empresas podem promover a inclusão social (emprego, consumo e empreendedorismo, de acordo com a definição do PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e identificou que a oferta de produtos e serviços às classes C, D e E (consumo) é a que tem maior influência positiva sobre a competitividade: 39% em média. A influência da contratação direta de empreendedores das classes C, D e E como fornecedores e distribuidores (empreendedorismo) e da contratação direta de empregados das classes C, D e E (emprego) foi bastante similar: 24% e 23% em média, respectivamente.
Empresas que possuem operações internacionais percebem de forma ainda mais positiva a influência da inclusão social na competitividade. Como a competição tende a ser mais acirrada no exterior, com dificuldades intrínsecas à atuação em realidades diversas, uma postura mais inclusiva pode ser vista como um diferencial das multinacionais atentas à sua contribuição para a sociedade.
Gráfico 3 » Percepção sobre a influência das diversas formas de inclusão social sobre a competitividade
A forma de inclusão social que mais fomenta a competitividade das empresas B2C é a inclusão pelo consumo. Nas empresas B2B, a influência do empreendedorismo é ligeiramente maior do que a do consumo, mas as duas são quase equivalentes. Para as empresas que atendem o governo (B2G), consumo e emprego são as formas de inclusão com maior impacto, com níveis muito superiores aos das empresas B2C e B2B.
Gráfico 4 » Percepção sobre a influência das diferentes formas de inclusão social sobre a competitividade, por tipo de consumidor
Como os ambientes interno e externo influenciam a inclusão e a competitividade?
O comportamento ético frente aos stakeholders foi avaliado como o fator condicionante mais importante na relação entre inclusão social e competitividade, considerando o ambiente interno. A valorização de práticas inclusivas pelos stakeholders e a inserção de stakeholders externos em processos decisórios da empresa também foram percebidos com grande potencial de impacto na promoção da inclusão social e da competividade.
Os resultados obtidos na pesquisa parecem indicar, portanto, que empresas com práticas avançadas de governança também promovem a inclusão social e a competitividade de seus negócios. Um bom processo de governança passa pela consideração dos interesses de stakeholders externos e pelo estabelecimento de relações pautadas pela ética com tais públicos. As empresas percebem, cada vez mais, que o sucesso de seus negócios depende de uma postura atenta à sociedade de uma forma mais ampla.
No que diz respeito ao ambiente externo, os fatores condicionantes com maior influência positiva na competitividade e nas três formas de inclusão pesquisadas são o acesso à eletricidade em locais remotos, o acesso à Internet por meio de dispositivos móveis e os modelos de negócios disruptivos intensivos em tecnologia (por exemplo: Uber, Airbnb). Interessante notar que infraestrutura, tecnologias e inovações não apenas promovem o avanço das empresas, mas também têm grande potencial de beneficiar os menos favorecidos.
A relevância do investimento em educação também foi um destaque da pesquisa. Treinamento e qualificação da mão-de-obra foram percebidos como formas importantes de favorecer a inclusão social e promover a competitividade tanto do ponto de vista interno quanto externo. Essa percepção está alinhada com diversos estudos que mostram o papel fundamental da educação para o desenvolvimento de uma sociedade.
Dentre as maiores influências negativas à inclusão e à competitividade, os executivos elencaram a crise econômica e o aumento da taxa de juros, seguidas pela concentração de riqueza, leis trabalhistas e baixo nível educacional das classes C, D e E. Esses fatores aumentam a exclusão social e dificultam que as empresas prosperem, o que por consequência traz efeitos negativos para a sociedade como um todo.
Finalmente, cabe destacar que alguns fatores exercem influência positiva em algumas dimensões e negativa em outras. A automatização dos processos produtivos influencia negativamente a inclusão pelo emprego, pois pode ser responsável pela diminuição de postos de trabalho, mas tem efeito positivo na competitividade e na inclusão pelo consumo e pelo empreendedorismo. Já as políticas públicas sociais exercem influência positiva na inclusão pelo consumo, por aumentarem o poder de compra das camadas mais desfavorecidas, mas contribuem negativamente para a competitividade das empresas e para a inclusão pelo emprego e pelo empreendedorismo, de acordo com a percepção dos executivos.
Dificuldade de mensuração
As empresas respondentes declararam ter dificuldade em mensurar a inclusão social e sua relação com competitividade. Na verdade, o nível de dificuldade em se medir a inclusão social aumenta quando o objetivo é mensurar o seu impacto na competitividade. Empresas de médio porte têm maior dificuldade de medir inclusão social e as empresas do setor primário parecem ter maior dificuldade para relacionar competitividade e inclusão.
Gráfico 5 » Nível de dificuldade de mensurar inclusão social e sua relação com competitividade
Sobre a pesquisa
A pesquisa Inclusão Social e Competitividade de empresas com operações no Brasil: Uma análise da percepção de executivos C-Level em grandes e médias organizações foi divulgada no FDC Global Thinkers’ Summit 2016 para apresentar os resultados das investigações feitas a partir das questões levantadas pelos participantes do Summit em 2015.
O FDC Global Thinkers’ Summit reúne formadores de opinião e executivos sêniores para aprofundar a discussão sobre o papel das empresas no desenvolvimento sustentável e foi concebido pela FDC como um processo cíclico de geração e aplicação de conhecimento relevante destinado à alta gerência das organizações.
Glossário
B2B – “Business to business” ou “Empresa para empresa”.
B2C – “Business to Consumer” ou “Empresa para consumidor”.
B2G – “Business to Government” ou “Empresa para Governo”. Stakeholders – Termo criado pelo filósofo Robert Edward Freeman que significa “públicos interessados”: grupos ou indivíduos que podem afetar ou serem afetados pelas atividades de uma empresa.