Muitos especialistas em negociação afirmam que existem dois tipos de negociação: as chamadas únicas (que não se repetem) e as repetitivas, que são recorrentes e, portanto, incidem novamente como, por exemplo, negociações entre fornecedores e compradores, entre o chefe e seus liderados, entre marido e mulher, onde é desejável que prevaleça a colaboração.
Negociação única. Única mesmo?
Exemplo do primeiro caso – negociação única – é a compra de um automóvel, de um televisor ou um imóvel, cuja negociação provavelmente não se repetirá outra vez com a mesma pessoa ou vendedor, portanto, segundo afirmam alguns especialistas, você pode ser competitivo neste caso, e levar vantagem sobre a outra parte sempre que possível. Era uma postura muito comum até alguns anos atrás, mas com o advento da internet esta atitude tem trazido muitos problemas aos seus adeptos. Imagine um vendedor comercializando um carro ocultando fatos negativos, como problema com o motor, ou a parte elétrica do veículo. É apenas uma questão de tempo para que o comprador lesado descubra o engodo. Ou então um “espertalhão” adquirir um veículo de uma viúva que nada entende de preço de mercado e comprá-lo por 30% a menos do que ele realmente vale. Hoje, na internet, existem literalmente milhares de blogs e inúmeras mídias sociais, como o facebook e twitters, denunciando pessoas e empresas por negociações antiéticas. São notícias que funcionam como um rastilho de pólvora contra os negócios desses indivíduos que não tem como deter o alastramento e propagação crescente das denúncias. O efeito pode ser devastador para seus negócios. E tudo não passava de negociações únicas!
Negociações únicas: dois casos
O conceito de negociação única é um grande equívoco. Quer ver? Cito dois exemplos.
Primeiro caso
Quando me mudei para Brasília, há vários anos, precisei comprar um imóvel no Lago Sul. Depois de muita procura, minha esposa encontrou a casa de seu sonho e cujo preço cabia no meu bolso. Várias negociações – com direito a choro e tudo – ocorreram com o corretor, um simpático mineiro, antes que fechássemos o negócio, que certamente acabou sendo bom para as três partes: eu (e minha esposa), o construtor do imóvel e o corretor. Era uma venda única, mas a dedicação, honestidade e integridade do vendedor despertaram minha atenção, e assim acabei indicando-o para três colegas meus que também nessa época estavam de mudança para Brasília. Ele acabou fechando negócio com dois deles, que igualmente mostraram-se muito satisfeitos com o atendimento e com a transação. A negociação, que seria “única”, acabou gerando duas outras vendas ao corretor.
Segundo caso
Primeiro ato. Certa ocasião ministrei um curso de negociação para uma das maiores empresas de produtos plásticos do país e o diretor de marketing, que mais tarde tornou-se meu amigo, contou-me que quando ele morava no Rio Grande do Sul, ainda jovem, foi procurar emprego de vendedor em uma determinada empresa de Porto Alegre. O gerente de vendas fê-lo esperar durante várias horas na antessala e, mesmo assim, não o atendeu, mandando avisar que o receberia somente no dia seguinte. Prontamente ele retornou no dia seguinte e, após outro chá de cadeira, acabou sendo recebido pelo gerente que, com atitude antipática e indiferente, avisou-o de que a vaga já havia sido preenchida no dia anterior e, portanto, nada mais tinham a tratar, impedindo meu amigo de mostrar suas qualidades e tentar negociar uma outra colocação. Inquirido pelo meu amigo, porque ele o deixou esperando tantas horas se a vaga não mais existia, a resposta do gerente foi muito simples: “Esqueci-me de que você estava aguardando” disse ele.
Segundo ato. Anos depois meu amigo, já como diretor de marketing da empresa de plásticos, situada em outro Estado, promoveu um recrutamento de distribuidores e vendedores. Na fila de pretendentes a vendedores reconheceu a fisionomia do gerente que recusou-o displicentemente anos antes em Porto Alegre. “A princípio pensei em fazer o mesmo com ele”, disse-me o diretor, “e deixá-lo aguardando por muito tempo, para depois recusá-lo. Mas depois imaginei que fazendo isso eu estaria me igualando a ele, e isto não condizia com meus princípios”, arrematou. “O mais interessante”, continuou o diretor,“ é que a pessoa em questão preenchia todos os requisitos com sobras, era a pessoa perfeita para um dos cargos disponíveis.” Ele acabou sendo contratado e, segundo meu amigo, tornou-se um dos melhores profissionais de vendas da empresa.
A sorte daquele ex-gerente é que o diretor de marketing revelou-se uma pessoa de princípios e não foi vingativo, o que não se pode dizer de muitos indivíduos que estivessem na mesma situação. Conheço vários casos parecidos em que o troco foi dado na mesma moeda, acrescido de juros e correção monetária. Chamo isso de “Efeito Roda Gigante”. Ocorre quando alguém impõe ou abusa de sua autoridade, ao estar por cima. E, num outro momento, ao girar a roda da vida, essa pessoa acaba por baixo, e quem se encontrava em situação de inferioridade assume posição de comando; é quando pode se dar o ajuste de contas.
Os dois casos narrados foram negociações únicas, mas existiram desdobramentos significativos mais adiante. Negociações únicas? Não acredite nisso, pois esse mundo gira muito, e sua única garantia e segurança é ter tido um comportamento ético e responsável, pois, quando, após um giro de 360 graus, circunstância semelhante voltar a defrontá-lo em outra ocasião num momento inesperado, você não terá nada a temer ou ocultar porque você agiu corretamente.
Texto extraído e condensado do livro Negociação – Técnicas Eficazes para Resultados Concretos, de Ernesto Berg, Juruá Editora. Para acessar o conteúdo ou adquirir o livro visite o site www.quebrandobarreiras.com.br seção de LIVROS.
Leia mais sobre gestão de empresas todos os dias aqui na JValério
Fonte: Falando de Gestão
Foto: Pixabay
O que achou sobre o conteúdo? Vamos conversar? Deixe um comentário.