A gestão de pessoas é um dos desafios das lideranças no pós-pandemia e investidores cobram uma postura mais dinâmica dos Conselhos de Administração em relação aos colaboradores
A área de recursos humanos ganhou uma nova dimensão na estrutura da governança corporativa com a pandemia. Se antes o RH era apenas um departamento, sua importância cresceu diante da necessidade compulsória de migrar para o home office e todas as implicações que a modalidade trouxe para o mercado de trabalho. Com essa transição, de forma abrupta, o setor passou a ser considerado estratégico por acionistas e investidores e virou um dos principais assuntos do Conselho de Administração.
Um estudo da empresa global de executive search ZRG Partners ouviu 127 empresas de grande porte, entre elas 14 brasileiras. O levantamento apontou que quase 80% dos Conselheiros globais disseram que passaram mais tempo debatendo questões sobre gestão de talentos nos últimos dois anos.
Para se ter uma ideia, a pesquisa demonstra que a estratégia e a gestão de talentos aparecem empatadas, com 71%, em primeiro lugar entre as competências mais relevantes para os Conselhos nos próximos 5 a 10 anos.
A preocupação tem fundamento, na visão da professora da Fundação Dom Cabral (FDC) Adriana Solé, que também é Conselheira Fiscal Suplente da Vale do Rio Doce. “O mundo não é mais o mesmo no pós-pandemia. O comportamento das pessoas mudou e essa transformação impacta diretamente no dia a dia das empresas. A sociedade civil organizada não admite mais companhias sem empatia, que não têm respeito por seu capital humano. E se antes já havia a necessidade de implementar uma área de recursos humanos mais estratégica, em substituição de um departamento acostumado a lidar apenas com questões burocráticas, como contratações e demissões, a pandemia expôs essa necessidade e a tornou uma urgência”, afirma Adriana.
A professora da FDC destaca ainda que os pedidos de demissão estão aumentando gradativamente desde a chegada do Coronavírus no Brasil, desde março de 2020. E, na visão dela, apesar de todos os sinais que a pandemia transmitiu para os empregadores, foi a pressão externa, dos investidores institucionais, que levou essa demanda, de transformar o departamento de recursos humanos em um setor estratégico, para a pauta do Conselho.
“Enquanto o RH não estiver ligado ao Conselho, por meio de um comitê técnico, continuará sendo apenas um departamento e terá pouca margem para desenvolver a percepção e a criatividade. Estamos num momento em que o S, de Social, da sigla ESG está em voga. Neste novo cenário, o que estamos fazendo? Ainda não vemos esse tipo de discussão nas empresas brasileiras. O que vemos é um RH que não tem resiliência para lidar com conflitos, que parece não estar preparado para lidar com pessoas, principalmente quando elas estão doentes. A preocupação com a produtividade ainda é maior que com as pessoas. E o RH precisa mudar e resgatar a alma da empresa, o orgulho dos colaboradores de trabalharem lá”, reflete Adriana.
O novo normal - sim, o mundo jamais voltará a ser como antes - exige novas estratégias, novos processos e formas de se relacionar em todas as esferas: parceiros, fornecedores, colaboradores e clientes exigem um novo posicionamento - mais humano - por parte das empresas.
Aquele futuro inovador que assistimos no desenho da família dos Jetsons já chegou: a Covid-19 tornou a digitalização uma realidade para todos os setores e estimulou a criação de novas comunidades e o aprimoramento do pensamento coletivo.
“A pandemia incentivou a vida digital e colaborativa - mesmo à distância - e mudou o mindset corporativo. O que convencionamos chamar de novo normal engloba diversos aspectos, como a digitalização dos processos para viabilizar o trabalho remoto. É inegável que o Coronavírus trouxe modernidade e inovação para as empresas”, destaca Clodoaldo Oliveira, diretor executivo da JValério Gestão e Desenvolvimento.
Os profissionais de recursos humanos precisam se adaptar à nova realidade e contribuir com a implementação de uma nova cultura corporativa. Entre os novos atributos do RH estão o planejamento de ações que direcionam o colaborador para a retomada social e econômica e promover o recrutamento transparente.
“As empresas precisam entender além das mudanças de comportamento do consumidor. Tão importante quanto é compreender as mudanças de comportamento do colaborador e como a crise sanitária impactou na sua rotina de trabalho. O recursos humanos estratégico é aquele capaz de focar no capital humano e entender os anseios da equipe”, salienta Oliveira.
Confira agora algumas sugestões para tornar o recursos humanos um setor estratégico:
Mudar o mindset do colaborador, para que ele se mantenha alinhado ao propósito, valores e objetivos da empresa é uma das funções do RH. Uma das principais dificuldades das empresas é a adesão dos colaboradores à transformação digital. Muitos deles têm resistência em relação à tecnologia e, para quebrar essa barreira, os gestores precisam treiná-los e mostrar a eficiência que essas ferramentas trazem para toda a organização.
A saúde mental do colaborador ganhou os holofotes com a Covid-19. E os questionamentos sobre transtornos, principalmente o Burnout, devem permanecer no novo normal. As empresas devem deixar claro que são cuidadosas em relação às questões emocionais, sobretudo no retorno ao trabalho presencial. O bem-estar e a qualidade de vida na corporação devem ser um dos eixos do RH estratégico.
O home office era uma tendência que se transformou em realidade há dois anos. As empresas perceberam as vantagens da modalidade que oferece comodidade e conforto para colaboradores e reduz os custos de infraestrutura dos empregadores. Cabe à equipe de RH avaliar os benefícios do trabalho remoto ou de um regime híbrido. Os pontos que devem ser avaliados são: economia de custos; produtividade da equipe; processos alinhados; gestão de pessoas; e ferramentas disponíveis.
O home office mudou a forma dos gestores se comunicarem com o time. Os líderes tiveram que buscar novas formas de comandar para manter a equipe engajada e o sentido de pertencimento, confiança e parceria. Mudanças na rotina e no controle de produtividade foram um dos maiores desafios dos gestores. A princípio, a instabilidade provocada pela pandemia deveria durar dois meses, mas por dois anos líderes e liderados se habituaram a se encontrar com a ajuda extra da tecnologia. Agora é hora de colocar os prós e contras das ferramentas online na balança e aproveitar os aprendizados durante a pandemia para traçar novas estratégias para liderar.
A forma da cobrança por metas também mudou na pandemia e o trabalho colaborativo ganhou destaque no novo normal. Talvez, o melhor caminho seja mensurar a produtividade do time e a contribuição de cada um para o resultado final de um projeto. Dessa maneira, os resultados mostram o engajamento de todos em uma causa comum e aumentam a sensação de pertencimento, tão necessária para a retenção de talentos.
A crise generalizada provocada pela Covid-19 e a mudança de comportamento das pessoas mostrou a importância da comunicação interna no ambiente corporativo. Num momento de instabilidade, um dos maiores desafios dos recursos humanos foi acalmar os ânimos dos colaboradores diante de alterações na rotina de trabalho e do sentimento de medo de perder o emprego e até de perder a vida com a chegada de um inimigo desconhecido.
Para manter o equilíbrio e a sanidade mental da equipe, os processos de comunicação tiveram que ser efetivos. Além disso, é por meio de uma comunicação clara que a empresa consegue engajar o time e mantê-lo alinhado com o propósito do negócio. E quando falamos de comunicação, pensamos também na ideia da escuta ativa, de dar voz para os colaboradores. Há questões do novo normal que só trazem benefícios para todos os lados e a melhoria nos processos de comunicação é uma delas. Uma comunicação eficaz demonstra a preocupação da empresa com seu capital humano. É um caminho sem volta: para manter o time engajado é necessário se comunicar bem.