Especialistas vinculados à Fundação Dom Cabral apontam agilidade na tomada de decisões e resiliência como pilares da gestão para aliviar os efeitos da Covid-19 na economia
A Fundação Dom Cabral (FDC) divulgou, na última semana, um estudo realizado junto a 450 empresas brasileiras de médio porte - aquelas que faturam entre R$ 5 milhões e R$ 500 milhões por ano. O objetivo do levantamento, feito entre novembro de 2020 e fevereiro de 2021, é avaliar o impacto da pandemia nas organizações. O próximo passo da escola de negócios, eleita a melhor instituição de ensino na área de gestão na América Latina, é orientar acionistas e gestores que estão à frente das médias empresas no desenvolvimento de ações capazes de melhorar a performance dessas companhias.
A pesquisa apontou que 47% sentiram os efeitos da crise. Eles afirmaram que o recuo da produtividade foi de 1%. Já entre aqueles que responderam que o impacto como muito negativo, a produtividade caiu 22%.
A boa notícia é que mais da metade, 53% dos entrevistados, disseram que não sofreram os efeitos da crise, sendo que 30% responderam que o impacto da pandemia foi positivo para os negócios e 9% que foi muito positivo. Além disso, 39% apontaram que conseguiram reagir às mudanças causadas pelo Coronavírus. Em 34% das empresas a produtividade cresceu, apesar das turbulências que marcaram a economia pós-Covid. Já as companhias que acreditam ter passado ilesas pelo solavanco da Covid-19 conseguiram aumentar em 22% a expansão da produtividade.
As empresas que fazem parte do setor do comércio foram as que se adaptaram melhor à crise e obtiveram os melhores resultados. Num cenário de tantas instabilidades e incertezas, também se destacaram as médias empresas com faturamento maior ou igual a 200 milhões.
Na opinião de Clodoaldo Oliveira, diretor executivo da JValério Gestão e Desenvolvimento, associada à FDC no Paraná, Rondônia e interior de São Paulo, essas organizações comprovaram que agir rápido, na tomada de decisões, nas melhorias nos processos internos e até na postura de assumir riscos, foi fundamental para se manterem competitivas e melhorarem seu posicionamento no mercado. “Foi capacidade de reação que ajudou parte das empresas entrevistadas a alcançar um bom desempenho, apesar do “tsunami” que surgiu de repente, trazendo ondas de choque de todos os tipos”, afirma.
Ele acrescenta que a pandemia exigiu mudanças e as empresas não tiveram tempo de adotar uma fase de transição: a adequação ao trabalho remoto, a regulamentação da telemedicina e o ensino à distância, por exemplo, já eram tendências, mas se consolidaram com o Coronavírus e mostraram que vieram para ficar. “Os gestores tiveram que tomar decisões urgentes para assuntos que até estavam na pauta, mas que não eram prioridade. A gestão de risco também se tornou palavra de ordem: novos objetivos passaram a ser definidos num plano de emergências, que pode ser colocado em prática num futuro muito próximo, em diferentes situações”, afirma Oliveira.
Para Erica Bamberg, professora associada da FDC, toda essa movimentação foi crucial para dar fôlego para que as empresas se recuperassem e vislumbrassem um futuro otimista. “Durante a pandemia, o empresário deixou de sonhar para sobreviver, para fazer as coisas funcionarem minimamente. Agora, começa a ver que, por mais que tenha altos e baixos, há movimentação, tem aumento de produtividade. Com os desafios e os acertos, ele sente que pode voltar a sonhar”.
O jargão “a crise é sinônimo de oportunidade” foi uma das percepções dos consultores da JValério ao analisar os resultados da pesquisa. É inegável que os efeitos colaterais da pandemia, principalmente na economia, foram sentidos por todos, mas aqueles que tiveram a disposição de inovar, num cenário de tantas incertezas, conseguiram se sobressair, na opinião de Clodoaldo Oliveira.
“Tanto que 63% dos participantes acreditam que sua performance foi melhor em comparação à concorrência e apenas 4% analisam que ficaram atrás dos concorrentes. E essa é uma informação importante porque que mostra que o espírito de resiliência, a crença na sua capacidade de superação, se faz presente entre nossos empresários, mesmo diante de tantos desafios e adversidades. Houve um momento, em que a Covid-19 chegou e pegou todos desprevenidos. Mas passado o susto inicial, grande parte conseguiu ver o sol no horizonte e focou na recuperação”, diz o diretor executivo da JValério.
Quando perguntados sobre as lições deixadas pela crise, os executivos pontuaram palavras-chaves e entre as mais citadas estão: caixa, inovação, agilidade e pessoas. “Em situações como essa, medidas de proteção de caixa são essenciais para os negócios. A quebra de paradigmas, um atributo das empresas inovadoras também se mostrou como uma ferramenta de sobrevivência em tempos de Covid-19. A rapidez na tomada de decisões é outro fator que foi decisivo no último ano, além da gestão de pessoas, que na minha opinião é o quesito mais importante. Apesar de vivermos num tempo que exigiu grande aporte tecnológico para as empresas se adequarem às mudanças impostas pelo novo Coronavírus, a valorização do capital humano é fundamental. Não basta investir em transformação digital: é necessário formar as pessoas para lidarem com as ferramentas para que a tecnologia seja efetiva e cumpra seu propósito. Sem a curadoria dos humanos, o maquinário se torna irrelevante”, destaca Clodoaldo Oliveira.
A pesquisa reforçou ainda o que especialistas em gestão e governança corporativa já vêm dizendo sobre a importância das chefias na condução da crise e sobre o novo perfil de líderes que emergiu com a pandemia, batizada de “liderança com propósito”. “A nova visão engloba preocupações que vão além dos resultados financeiros. Vão se destacar no mercado as empresas envolvidas com o progresso social, ou seja, que geram impactos positivos na comunidade onde atuam. Essa é uma mudança grande no mundo corporativo. As novas gerações são muito voltadas para propósito, para emoção, para paixão com ideias e eles estão no topo da pirâmide do consumo. Então, as empresas têm que vincular emocionalmente seu propósito com os valores da nova geração. Em resumo, o propósito de uma da marca precisa estar alinhado com a visão de mundo do público interno e externo”, finaliza Clodoaldo.