2023 está no ar. E agora José?

16/12/2022
2023 está no ar. E agora José? | JValério

Leitura de cenários demonstra que o Brasil é uma rota viável para abrigar investimentos estrangeiros. É hora de fazer gestão de riscos e de se preparar, com otimismo realista e resiliência, para aproveitar as oportunidades mesmo em momento de crise

Começamos 2023 com um novo presidente no comando do país. Lula inicia seu terceiro mandato, mas encontrará um ambiente econômico ainda mais hostil em relação às duas primeiras décadas dos anos 2020.  O Relatório Global do Fundo Monetário Internacional (FMI), divulgado no último mês de outubro de 2022, aponta para uma crise na economia global, inclusive em potências como Estados Unidos e China.

Diz o resumo do Relatório: “a atividade econômica mundial está passando por uma desaceleração ampla e mais acentuada do que o esperado, com uma inflação mais alta do que a observada em várias décadas. A crise do custo de vida, o aperto das condições financeiras na maioria das regiões, a invasão da Ucrânia pela Rússia e a persistente pandemia de COVID-19 pesam muito sobre as perspectivas”.

Para Bruno Carazza, professor da Fundação Dom Cabral (FDC), esse será um dos dilemas do governo Lula. “Em 2023, enfrentamos os efeitos pós-pandemia com momentos de lockdown na China e obstáculos na cadeia logística. Além disso, a guerra na Ucrânia não tem perspectivas de interrupção a curto prazo. Os conflitos ocorrem em locais estratégicos, entre Europa e Ásia, e alimentam grande especulação de preços de energia, petróleo e gás natural. E em cenários de incertezas há retração de investimentos e a economia cresce menos. Vários países aumentam as taxas de juros e, consequentemente, há um impacto no câmbio. Esse é o contexto desafiador e desfavorável, que coloca pressão adicional para Lula”, afirma.

E num momento como esse, é primordial que os empresários também compreendam a importância de analisar cenários para gerir os negócios em tempos de crise. Essa é a sugestão de outro professor da FDC, Paulo Vicente. Ele utiliza o modelo dos ciclos de Kondratieff para estudar os cenários globais.

Conforme essa teoria, cada ciclo encerra com uma crise que força a reinvenção do capitalismo. O sistema se restabelece por meio do surgimento de uma onda tecnológica, que provoca mudanças culturais e desencadeia transformações sociais e no mercado de consumo. E são essas modificações que projetam saltos na economia. É assim que o capitalismo se sustenta: quando mergulha no caos, consegue emergir graças a uma revolução tecnológica, que acontece a cada 50, 60 anos.

E, o intervalo que compreende os anos de 2018 a 2030 corresponde à subfase do quinto ciclo de Kondratieff, aponta Paulo Vicente. Depois do advento da internet, na década de 1990, no período de 2005 a 2018, a economia mundial entrou na fase de esgotamento, que precedeu a crise atual. Em resumo, é assim que se alimenta o ciclo de Kondratieff, em três etapas principais: esgotamento, crise e recuperação. E, com base nele, na visão de Paulo Vicente, até 2030, as empresas terão que se adaptar internamente e prever os cenários globais para conseguir reagir e seguirem sendo competitivas em um tempo de volatilidade na economia.

Bola de cristal

Sim, é impossível prever o futuro. Não há como dizer como os governos e as empresas vão conseguir driblar a crise e caminhar para a etapa de recuperação, como sugere a teoria de Kondratieff. “Como não temos clareza dos resultados, sempre uso a técnica de cenários, para pensar em possibilidades e probabilidades, ao invés de buscar ‘falsas certezas’”, afirma Vicente.

Os desafios econômicos para as empresas em 2023

Como não são dotados de bolas de cristal, a sugestão do professor da FDC é que os gestores façam um exercício de imaginação para buscar respostas possíveis e críveis, de acordo com o que mostra a realidade. E são elas que nos ajudam a mapear cenários. Hoje, os principais conflitos humanos são: controlar o crescimento populacional, preservar o ambiente (recursos), e erradicar a pobreza.

“Teremos que escolher dois desses três objetivos conflitantes. Uma parte dos pesquisadores enxergam a tecnologia como a alternativa para todos os problemas. Eles falam sobre abundância quando o outro grupo prevê a escassez. Essa outra corrente acredita que o mundo está entrando em colapso, por conta dos problemas ambientais. Quem está certo? Os dois modelos de pensamento. O cenário atual aponta para a necessidade de uma corrida em busca da sustentabilidade. Se as pessoas querem consumir mais, precisamos de um patamar de equilíbrio. Em 2100 serão 11 bilhões de humanos no planeta Terra. A tecnologia irá nos salvar? É possível ter um novo continente, com novos recursos?”, reflete Vicente.

Brasil se torna uma saída

A falta de recursos naturais inibe o crescimento nos Estados Unidos e Europa. Lá não há petróleo. Países são obrigados a instalar fábricas na Ásia, onde tem fonte de energia e mão de obra barata. E é assim que Japão, China, Taiwan, Malásia iniciam uma terceira corrida colonial, liderada agora pelos asiáticos e não pelos europeus.

As oportunidades de crescimento para o Brasil em 2023

É neste contexto que territórios como Austrália, Nova Zelândia e Oceania ganham destaque para a exploração feita pelas grandes potências. Lá tem petróleo e comida. Daí o interesse dos japoneses. Mas não é uma região rica o suficiente para sustentar esses interesses. Os novos colonizadores precisarão olhar para a prioridade número 2:  a África. Mas o continente não está pronto no quesito logística, por exemplo. Os asiáticos investem lá para melhorar as condições para a exploração no futuro. A terceira opção é a América do Sul, que é rica e preparada, mas longe da Ásia e perto dos Estados Unidos, que é o outro “co-petidor”. E, neste sentido, os “co-petidores” são obrigados a lidar um com o outro”, argumenta Paulo Vicente.

O professor explica ainda que, no século 21, China, Índia, Coreia do Sul, expandem sua capacidade aeronaval e chegam à bacia do Índico. Eles querem ter monopólio de acesso a tais recursos naturais, como acontecia entre os séculos 16 e 19. E já estão avançando. A China já criou uma colônia na África. É assim que começa uma nova corrida colonial.

“A China chegou ao limite do crescimento e será ultrapassada pela Índia, como já defendem alguns teóricos. Nesta circunstância, o mais provável de ocorrer é uma guerra fria entre o Ocidente (incluindo Japão) e a China. Um êxodo industrial para fora da China, que já vem ocorrendo, se acelera e pode beneficiar o Brasil, com parte desta indústria vindo se fixar aqui por conta de uma exposição ao risco militar menor. Este acaba sendo o melhor cenário para o Brasil, pois o dinheiro, empregos e indústria fluem para cá”, destaca Vicente.

O professor Bruno Carazza elenca outras características do Brasil, que colocam o país em destaque no que diz respeito à atração de investimento estrangeiro. “Somos uma democracia há 40 anos, com alternância de poder de partidos da esquerda e da direita com instituições sólidas. Além disso, o Brasil possui uma disponibilidade de recursos naturais; é grande exportador de commodities; e possui uma população com cerca de 215 milhões de habitantes, conectadas à internet e com perspectivas de consumo”, relata.

Outro fator que favorece o Brasil, segundo Carazza, é o fato do mundo estar repensando as relações com a China. As multinacionais estão redirecionando as realizações de investimentos e o Brasil está na rota por conta de sua posição geográfica, próxima dos Estados Unidos e da Europa.

Leitura de cenários é a nova bola de cristal

A leitura de cenários é importante porque irá orientar as lideranças a desenvolverem um planejamento estratégico com os pés no presente e os olhos no futuro. A dica do professor Paulo Vicente é projetar como será seu negócio daqui há 10 anos, quando o ciclo de Kondratieff atual entra na fase da recuperação.

Desafios para o desenvolvimento do planejamento estratégico

 “Esse é o desafio dos empresários: pensar quais as tarefas precisam realizar para ser sustentável e competitivo no horizonte de dez anos. Essa é a linha do planejamento ambidestro. Além disso, é preciso prever, a curto prazo, mudanças abruptas de cenários, porque vivemos num momento de mudanças abruptas e constantes. Os anos de 2023 e 2024 serão de gerenciamento de riscos, mas não podemos perder de vista as conquistas que projetamos para o nosso negócio nos próximos dez anos”, propõe o professor.

Agro traduz o cenário brasileiro

O agronegócio, na visão de Bruno Corazza, expõe o momento que vivemos no Brasil: crise e oportunidades. Ao mesmo tempo que o setor sofre com a pressão de custos - redução de fertilizantes e aumento dos preços desse insumo, por conta do custo do frete e da taxa cambial - encontra oportunidades para expandir num mundo em crescimento populacional, que depende dos alimentos.

A importância do agro para o Brasil em 2023

“No Brasil, o agro tem uma perspectiva de ganho de produtividade. Há pastagens que são subutilizadas e que podem virar áreas de cultivo sem gerar pressão sobre o meio ambiente, por conta do crédito de carbono. Também há melhorias na rede de infraestrutura, movimento de concessões de rodovias, ferrovias, aeroportos e portos são investimentos que irão frutificar.  Temos uma série de oportunidades que podemos explorar e que apresentam muitas chances de negócios e crescimento, não só para o agro, mas em outros setores”, depõe Bruno Carazza.

Otimismo realista e resiliência

O recado de Bruno Corazza para empresários e gestores é claro: “não podemos deixar que o pessimismo e a incerteza nos paralisem. Temos problemas, inseguranças, mas há oportunidades grandes e valiosas a serem exploradas nos próximos anos. Independente do governo, podemos avançar em termos de País”, finaliza.

Previsões empresariais para 2023
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