Processo sucessório: mulheres enfrentam barreiras nas famílias empresárias

31/08/2022
Processo sucessório: mulheres enfrentam barreiras nas famílias empresárias | JValério

Co-fundadoras e herdeiras ainda têm participação menor nas empresas familiares, dizem pesquisas; estudo da PwC aponta que 41% dos homens acreditam que estão mais propensos a liderar do que as mulheres

Um estudo recente conduzido pela KPMG Private Enterprise e pelo STEP Project Global Consortium fez um raio x das empresas familiares do mundo todo. A pesquisa ouviu 1.800 líderes em todo o mundo e mostra que apenas 18% dessas organizações são lideradas por mulheres.

Os pesquisadores, no entanto, questionam esses números porque acreditam que as co-fundadoras desempenham um papel importante na organização. Eles apresentam no relatório do estudo o termo “CEO ocultas” para designar as mulheres que cuidam das necessidades emocionais da família. Segundo os estudiosos, são elas que mantêm o clã unido e perpetuam os valores e tradições para a próxima geração. 

O relatório diz ainda, “mesmo (quando atuam) como cofundadoras e coproprietárias de empresa familiar, as mulheres muitas vezes ficam à margem, enfrentando desafios semelhantes aos encontrados no mundo corporativo mais amplo em termos de discriminação de gênero e estereótipos”.

Clodoaldo Oliveira, diretor executivo da JValério Gestão e Desenvolvimento, concorda que a inclusão das co-fundadoras e coproprietárias é mais um desafio na gestão da empresa familiar. “Temos que reconhecer que o aumento do número de mulheres na força de trabalho foi uma das mudanças mais significativas nas economias do mundo todo nos últimos 40 anos. Elas quebraram paradigmas e assumiram cargos executivos em setores tão abrangentes como a fabricação de automóveis, mineração, construção e tecnologias avançadas”, diz. 

 No entanto, acrescenta Clodoaldo, apesar de tantas conquistas, as mulheres ainda enfrentam muitas dificuldades para se sobressair no mundo corporativo, por conta de estereótipos. “E, nas famílias empresárias, não é diferente. Embora as herdeiras tenham envolvimento e interesse nos negócios, suas contribuições nem sempre foram reconhecidas ou admitidas em um cargo oficial”, aponta. 

Jeitinho feminino para quebrar as barreiras 

Marion Klimmek, neta mais nova do fundador da Condor, a maior indústria de escovas de dentes da América Latina, faz parte de uma geração de mulheres que tiveram que lutar para conquistar seu “lugar ao sol”, mesmo ocupando uma posição nobre no universo corporativo: a cadeira de herdeira. Ela passou por muitos altos e baixos até chegar à governança corporativa da Condor. E apenas há seis anos se sente confortável no lugar que era seu de direito e que abraçou com a força de uma leoa – uma característica nata do comportamento feminino. 

A caminhada de Marion até chegar a esse posto foi dura e longa. E executiva chegou a ser demitida na primeira passagem pela empresa.  Foi apenas em meio a um cenário de turbulências, anos mais tarde, que a trajetória na Condor começou a fazer sentido para a executiva (confira a história dela neste post: Era uma vez a história de uma herdeira que foi até demitida - JValério (jvalerio.com.br). Aos poucos, ela foi se envolvendo e percebeu que poderia selar a paz com o destino e ser feliz no trono de herdeira. Ela avalia que todo esse processo fez parte do seu amadurecimento, como pessoa e profissional de gestão. 

“Se não tivesse agido dessa maneira, com muito jogo de cintura em meio aos conflitos familiares, talvez me arrependeria por não ter feito nada para reverter a situação. O senso responsabilidade e o envolvimento com a empresa falaram mais alto. A história que meus avós e meus pais construíram tinham muito valor para mim. Foi desafiador conviver, no ambiente do trabalho, com outras gerações. Primeiro, tive que dividir a mesa de reuniões com homens da minha família, que tinham me pegado no colo. Depois, com sobrinhos e filhos, mais novos. O casamento entre família e empresa não é perfeito. Temos que aprender a separar a emoção da razão, aprender a respeitar o outro, a fazer concessões e a negociar, individualmente. Essa é riqueza da vida, melhorar sempre”, avalia Marion.

Mudança

Outra pesquisa, a Global NextGen 2022 da PwC, publicada no último mês de agosto, diagnosticou que se as empresas familiares estão em busca de resultados rápidos no quesito diversidade precisam seguir o exemplo da Condor. O primeiro passo, segundo o estudo, é analisar o papel relativo dos homens e das mulheres da nextgen - uma abreviação de “next generation”, ou próxima geração. 

A pesquisa aponta que tanto as mulheres como os homens colocam o crescimento dos negócios como prioridade máxima no mundo (53%, em comparação com 69% dos homens). Contudo, elas estão ligeiramente mais preocupadas com a inovação, como a inclusão das práticas ESG. Melhorar as condições de trabalho e a sustentabilidade são questões mais importantes para elas do que para eles.

A diferença se resume às expectativas de liderança, de acordo com a Global NextGen 2022 da PwC:

  • 35% das mulheres e 41% dos homens acreditam que há uma expectativa maior de que os homens administrem o negócio.
  • 41% dos homens acreditam que estão mais propensos a liderar do que as mulheres. Isso talvez aconteça porque as mulheres tendem menos a ocupar cargos de liderança no momento – 43%, em comparação com 59% dos homens.
  • 25% das mulheres dizem que precisam entender mais do negócio antes de sugerir qualquer mudança, em comparação com 13% dos homens. 

Para a geração atual, o estudo deixa um recado importante: há uma necessidade clara, nas empresas familiares, de diminuir os gaps de gênero na própria família.

Lição de casa 

Clodoaldo Oliveira acredita que a inclusão das mulheres dentro das organizações, em cargos de liderança, é uma responsabilidade dos homens que ocupam tais cargos. “É hora de trabalhar juntos, abrir mão dos estereótipos e promover a diversidade nas empresas”, avalia o diretor executivo da JValério. 

Conforme ele, dar chances às herdeiras é a primeira atitude para levantar a bandeira da inclusão das famílias empresárias. Após a conclusão desta lição de casa é hora de ampliar a diversidade e incluí-la na cultura organizacional. “O S, de social, da sigla ESG, precisa estar presente nas empresas. Pessoas 50+, comunidade LGBTQI+, negra e PCD, entre outros grupos, precisam fazer parte das equipes das organizações no futuro. As empresas precisam dar o exemplo sobre respeito e igualdade, como uma forma de contribuir com a construção de um mundo melhor”, finaliza Clodoaldo. 

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