Impostos no Brasil: o que esperar da Reforma Tributária

07/12/2023
Impostos no Brasil: o que esperar da Reforma Tributária | JValério

Conversamos com o consultor tributarista, Lucas Ribeiro, para entender melhor as projeções após a aprovação final da PEC 45/2019, prevista para 2024

Vamos falar sobre um assunto que mexe com o bolso do cidadão e empresariado brasileiro? Quase no apagar das luzes de 2023, o Plenário do Senado concluiu a votação da Reforma Tributária.

Isso significa que o próximo ano promete começar aquecido por causa dos debates acerca do tema, uma vez que ela foi aprovada e retornou à Câmara dos Deputados, para aprovação final. Contudo, o texto original passou por uma série de mudanças antes de voltar para casa e só deve se tornar lei após o Congresso Nacional chegar a um acordo sobre o novo modelo de tributação.

Quer entender melhor para onde estamos caminhando em se tratando da dinâmica de arrecadação nacional? Continue a leitura e saiba o que muda, quem será afetado e, certamente, o que esperar da Reforma Tributária em 2024.

Por que precisamos de uma Reforma Tributária

Aguardada há mais de 30 anos, a PEC 45/2019 propõe a unificação de tributos e a criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) a partir da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), aplicados nos âmbitos federal e estadual/municipal, respectivamente. Em outras palavras, o objetivo é simplificar o sistema tributário do país, considerado um dos mais complexos do mundo. Para se ter uma ideia, estudos apontam que são necessárias mais de 1.500 horas para se manter em dia com toda a legislação. Em comparação com outros países da América Latina, isso é 5x mais que a média dos nossos hermanos.

Além disso, tanta burocracia custa caro e chega a representar até 5% do faturamento das empresas. Em se tratando das pequenas e médias, o panorama é pior: o custo chega a ser 8 vezes maior nas PMEs. Sem falar que essa complexidade gera litígios que oneram os cofres públicos. No fim das contas, não existem benefícios nem para quem paga, nem para quem fiscaliza. Diante do cenário, nossa realidade tributária ainda reflete negativamente na visão de investidores estrangeiros, acostumados a ambientes de negócios nos quais os níveis de segurança são maiores. Após a reforma, a expectativa é aumentar a competitividade nacional e impulsionar a economia.

Reforma Tributária deve ser aprovada em “fatias”

Em meio a intensas discussões entre senadores e deputados federais, tudo leva a crer que devido às discordâncias a proposta será “fatiada”. Ou seja, a parte em que há consenso acabará sendo promulgada antes, enquanto os trechos restantes seguem tramitando como uma nova proposta. Vale lembrar que o fatiamento de propostas de emenda à Constituição (PEC) é uma prática comum desde a década de 1990. Todavia, ao contrário dos projetos de lei, só é promulgada se houver unanimidade.

Em resumo, para a maioria dos parlamentares, a aprovação no Senado é apenas o início dos trabalhos. Os políticos precisam ouvir todos os representantes das categorias interessadas no assunto e também se preocupar com a pressão orçamentária do governo, afinal, existem algumas inseguranças sobre partilhar receitas entre os entes - União, Estados, Municípios e Distrito Federal.

Nos bastidores de todo esse movimento, o advogado, professor e consultor tributarista, Lucas Ribeiro, esteve acompanhando tudo de perto. Segundo ele, “a reforma é necessária para o Brasil”. Embora encaminhada, o especialista reforça que há muito a se discutir até que ela se conclua e é esperado que as empresas precisem de tempo para se adaptarem.  Aliás, todo o processo pode durar até uma década.

O fundador e CEO do grupo ROIT, consultoria de hiperautomação na gestão contábil, fiscal e financeira, participou do Comitê promovido pelo programa Parceiros para a Excelência (PAEX), no dia 28 de novembro. Na ocasião, Ribeiro fez uma síntese sobre os principais pontos de interesse geral a respeito da reforma.

Confira o que foi dito e esclarecido no encontro a seguir.

O que muda com a Reforma Tributária

Atualmente, existem cinco tributos que incidem em produtos: PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. Como dissemos anteriormente, a proposta da reforma é unificá-los em apenas dois: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Ambos vão seguir a mesma lógica do Imposto sobre valor Agregado (IVA).

Só para ilustrar, imagine a negociação entre o fabricante e seu distribuidor. Ao vender o produto, a indústria pagará tributos apenas sobre o valor que foi agregado na sua operação. Isto é, já descontados os valores que foram pagos por seus fornecedores. É a mesma lógica das apurações de ICMS, IPI, PIS e COFINS, porém sem diferenças na hora de operacionalizar cada um deles - o que resulta em complexidade e, por consequência, induz ao erro.

Portanto, a medida é importante, sobretudo, em setores industriais de maior complexidade, aqueles que contemplam várias etapas até a finalização do produto. Com o novo modelo de tributação, a taxação será somente sobre o valor agregado em cada etapa da produção de um bem ou serviço, excluindo o montante pago anteriormente. Hoje, cada elo da cadeia produtiva arca com o custo do imposto cheio.

Quem será afetado

De acordo com Ribeiro, todos os setores terão as cargas igualadas e serão afetados pela Reforma Tributária, exceto os microempreendedores individuais (MEIS). As empresas que comprarem do MEI não tomaram crédito de IVA.

Os negócios inscritos no Simples Nacional (6 milhões) terão que fazer uma análise de compras e vendas B2b para ver se compensa permanecer no regime. Para os inscritos nesta figura a opção será a tributação do IVA em regime normal.

As empresas do Lucro Presumido (1.074.861) terão que conviver com os dois regimes de tributação. As apurações serão feitas de créditos e débitos e não sobre a Receita Bruta. Portanto, as operações serão muito parecidas com o Lucro Real.

Já as inscritas no Lucro Real (221.830) também conviverão com dois regimes de tributação. Nesses negócios, haverá a apuração de créditos e débitos, como já acontece hoje.

No entanto, na opinião de Ribeiro, quem for prestador de serviços, especialmente os que se enquadram no Simples Nacional, terão um desafio a mais. “Diferentemente da indústria, elas terão limitações de créditos ao mesmo tempo em que irão pagar mais tributos e absorver na margem”, explica. Como o prazo para receber será de até 60 dias, o efeito de preço e caixa passa a ser perigoso. “Esses negócios terão que cobrar mais, mas os clientes estão dispostos a pagar?”, reflete.

Sem a reforma, a apuração de créditos e débitos é realizada, prioritariamente, nas empresas do lucro real. Para Ribeiro, uma conta relativamente fácil para esse tipo de enquadramento. Após a promulgação da PEC, quem pertencer ao lucro presumido e ao Simples Nacional vai operar como se fosse do lucro real. “A contabilidade terá que ser feita o mais rápido possível, caso contrário, no mês seguinte a guia terá um valor alto em detrimento da ausência de créditos que compensem os débitos das vendas”, detalha, sem deixar de reforçar que o controle rigoroso passará a ser mais fundamental que nunca. Em contrapartida, quem não optar pelo IVA, automaticamente ficará sem os créditos.

Seja como for, o temor de quem atua sob esse regime é justificado não só pelo aumento da carga tributária, como quando comparado às modificações aplicadas a outros tipos de contribuintes PJ. Enquanto um não poderá usufruir dos créditos, o outro terá acesso a eles. O que leva a crer que haverá um descompasso entre os benefícios, contrariando a expectativa inicial que falava justamente em igualar as contribuições para ninguém sair perdendo.

Todavia, o conceito de insumos pode ser alterado enquanto a PEC estiver em tramitação. “Esse é um detalhe importante, visto que é preciso saber o que irá gerar créditos na nova sistemática”, questiona Ribeiro. E acrescenta: “o método atual é de crédito amplo. Caso tenha sido tributado na etapa anterior, então não gera crédito, o que só ocorre nas três junções do IVA quando somam os tributos”. São considerados fora do crédito: pessoa física, o que não foi tributado na cadeia anterior e consumo pessoal.

“O lucro presumido deve acabar, porque só valerá para quem tem muita receita. A cumulatividade era sua grande vantagem e não existirá mais”, salienta o CEO do grupo ROIT.

O que esperar para 2024

Para Ribeiro, os próximos dois anos serão intensos porque as empresas vão precisar se reorganizar. Inclusive, o consultor faz uma analogia para exemplificar o atual momento econômico. “Normalmente, na reforma de imóveis utiliza-se os pilares e parte da estrutura como base para as modificações. Na tributária, temos o oposto: será construída uma nova casa, do zero, ao lado da antecessora. Até que a segunda fique pronta, ambas serão utilizadas simultaneamente por 18 meses. Passado esse período, lá por 2033, conseguiremos derrubar a construção antiga e seguir a jornada sob o novo teto”, exemplifica.

Assim sendo, “teremos que reaprender enquanto continuaremos usando os mecanismos atuais. Todos os sistemas terão um prazo curto para readequação e haverá mudanças de preços e contratos”, finaliza Ribeiro. Nesse sentido, tudo indica que implementar as alterações vai exigir um grande investimento das empresas e do próprio fisco. Paralelamente, a Receita Federal estabeleceu diretrizes por meio do Programa de Reforma Tributária do Consumo (Programa RTC).

No lado corporativo, a revisão das projeções financeiras e do planejamento estratégico de médio prazo serão inevitáveis, já que as mudanças terão impacto na formação de precificação, nos modelos organizacionais e logísticos de centros de distribuição, entre outras questões de suma importância e vitais à sobrevivência das organizações.

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